DISCURSO DE POSSE AMeB

15 DE MARÇO DE 2022

Boa noite a todos: senhoras e senhores, confreiras e confrades, autoridades presentes e convidados.

Senhores componentes da mesa:

- Acadêmico Doutor Marcus Vinícius, presidente da Academia de Medicina de Brasília a quem substituo nesta solenidade;

- Doutor Nasser Sarkis Simão, representando a Associação Médica de Brasília e seu presidente Doutor Ognev Cosak;

- Doutor Leonardo Pitta, vice-presidente do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal;

- Doutor Gutemberg Fialho, presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal e da Federação Nacional dos Médicos.

Este momento é de festa.

Meu sentimento é de gratidão.

A perspectiva é sequência e reestruturação de projetos, ou seja de ação.

Para isso, partilharei algumas reflexões, que constituem a base pessoal e as linhas que irão direcionar os próximos dois anos.

A primeira é a gratidão.     

À medida em que a o tempo passa, na escada da vida vão restando menos degraus. Sem volta. Com certeza não quero descê-los, mas subir com galhardia os degraus que me restam.

Para isso buscarei o amparo da diretoria e de todos, confreiras e confrades, que acreditaram em mim e me destacaram para esta posição de presidente.

No que se refere a trajetória já realizada eu deveria citar e agradecer inúmeras pessoas. Mas, como homenageá-las? Foram e são tantas, nessas sete décadas da minha vida. Nas reminiscências, as evidências mostram alguns méritos pessoais, porém, muito mais que isso, as pessoas que compartilharam a caminhada comigo e o destino. Ambos foram bondosos comigo.

Nesse caminhar fui, na maioria das vezes, mais passageiro do que condutor. Um passageiro privilegiado.

A honra do cargo que agora assumo, as experiências vividas, os reconhecimentos recebidos, não foram almejados por mim na dimensão em que ocorreram, mas os recebi e me gratificaram no contexto da minha história de vida, sonhada e compartilhada nos ambientes de trabalho, nas associações em que participei e participo, e na inserção acadêmica.

Aprendi muito e experimentei que a vida nos permite ir além das expectativas.

Assumo o cargo de presidente da Academia de Medicina com imensa gratidão. Consolida a minha crença nos valores humanos que tenho exercido na medicina e no viver, seja pelo cuidado àqueles que sofrem, seja pela procura do caminho do bem. Tudo isso teve repercussão e se tornou em acolhimento pelos que comigo conviveram e convivem.

Muito obrigado pelo olhar benevolente.

A segunda reflexão é sobre a vida associativa

Acredito que as pessoas que desejam e têm a oportunidade de construir além da própria história, ampliando suas ações pela inserção na dimensão social, são abençoadas.

É provável que o poeta português Fernando Pessoa, ao dizer que o homem tem o tamanho de seus sonhos, tenha cogitado sobre essa dimensão da saída do eu próprio para as abrangências coletivas.

O exercício dessa possibilidade faz a grandeza do ser humano, que embora finito constrói o porvir de um mundo que não irá desfrutar.

Participar, apoiar e ser apoiado, criam as ações, que determinam resultados, que não são de ninguém em especial e são de todos ao mesmo tempo.

Poder ser inserido, ser catalizador de anseios, demandas e vontades, é ser voz, autor e ator da transformação de um mundo em construção e inacabado.

A terceira reflexão é sobre as oportunidades

A escolha da minha pessoa para dirigir tão seleto grupo de acadêmicos acena pela necessidade de continuar minha trajetória.

Nesta etapa da vida, quando existe a possibilidade de usufruir o que foi construído, entendo que assumir esta função tem o corolário de uma sinalização que não permite me tornar desinteressante por abdicar de ser interessado.

Almejo o sucesso crescente da Academia de Medicina de Brasília e tenho consciência de que todo sucesso tem seu preço que se paga com três coisas: trabalho, mais trabalho e muito mais trabalho.        

Paradoxalmente testemunhamos que o movimento que se faz necessário para ampliar construções em andamento, muitas vezes é acompanhado de resistências. Algumas vezes o instinto de sobrevivência da mesmice é realmente espantoso. Ponto a ser observado e enfrentado, se ocorrer.

Daí, no dizer de Toynbee, os rumos das mudanças devem ser traçados pelos que são criativos, infelizmente, uma minoria. E, criatividade, com seriedade e sobriedade, parece ser um bom ponto de partida para este momento da nossa Academia de Medicina, reencetando suas ações neste interregno para a pós crise.

Embora saibamos de antemão que a implantação do novo obedecerá à sequência exposta por William James em 1907: "Primeiro a nova teoria é atacada por ser absurda; depois admite-se que é verdadeira, mas óbvia e insignificante; por fim ela é considerada tão importante que até os adversários afirmam que foram eles que a descobriram".

O que importa é que as boas ideias se implantem, não as pessoas que as têm, embora não se olvide o mérito, na busca de novos paradigmas, olhando para o futuro.

No marco inicial da marcha acelerada rumo ao futuro há o risco do paroquialismo do presente que se esquece do passado, risco esse que não pode se impor. Somos elos de uma cadeia sem fim, sempre em construção, que não subsiste sem os alicerces dos que nos antecederam

A quarta reflexão é sobre a Academia de Medicina

Ser membro da Academia de Medicina é um privilégio. A Academia é privilegiada.

Não somos governo e nem oposição. Somos parte dos profissionais médicos renomados e conceituados do Distrito Federal e, seguramente aqui convivemos com diversas correntes de pensamentos.

Não somos sindicato, não somos associação de especialistas, não temos ajuda governamental nem privada, embora as portas estejam abertas às parcerias sem conotações de subordinações.

Não temos compromisso com corporações e não precisamos fingir modéstia. Muito menos manifestar arrogância.

Todos nós acadêmicos atingimos a fase da vida onde os objetivos profissionais, familiares e individuais foram atendidos.

Mas, persiste, em cada um de nós, o ideal e a intenção de trabalhar para um mundo melhor.

A Academia trata de informar e tomar as rédeas sobre as melhores estratégias para preservar e melhorar a medicina, com foco no bem estar coletivo.

Ideal esse que se tornou impositivo, em vista do momento de crise em que vivemos.

Não se trata da pandemia atual, ocorrência cíclica na humanidade, mas da construção do caminho novo que adeque a medicina arte, humanística e focada no paciente, com a incorporação massiva e constante de novas tecnologias, sabendo-se que estas são cativantes e encantam, mas também produzem o alheamento da abordagem holística da pessoa/paciente.

Assim o humano, para a Academia de Medicina transcende o biológico e engloba o universo cultural, filosófico, social e político com as lentes voltadas para o passado histórico, o presente e o futuro

Tudo isso deixa claro que os acadêmicos que aqui congregam continuam apaixonados e ativos, na luta pelos ideais da medicina.

E a Academia é o caldeirão, que impede que a paixão esmoreça e a faz sempre ativa na busca do bem.

Todos aqui têm pressa. Às vezes pela impaciência da indolência de ações que nunca se efetivam. Constantemente pela subordinação ao fator tempo que, para muitos de nós é curto.

A Academia quer e precisa ver as mudanças ocorrerem e não vai esmorecer.

Acreditamos nas mudanças incrementais progressivas e progressistas. Não se trata de uma revolução, que muitas vezes mais desagrega que constrói.

A Academia acredita na ciência, na pesquisa científica não só da medicina, mas de todas as áreas sociais, econômicas e técnicas.

Nessa visão colabora com as demais entidades medicas locais, aqui representadas, regionais, nacionais e também internacionais para a troca de ideias e construção de propostas e soluções

No que tange à responsabilidade que assumo, me sustento na força da amizade, na necessidade da técnica, na audácia, na crítica, na individualidade humana, mas, sobretudo, creio na dignidade e na consciência  de todos os que fizeram e continuam fazendo a construção física, moral e ética da sociedade em que estamos inseridos

O que importa não é o que se tem na vida, mas quem se tem na vida

Por isso, agradeço a Deus: pela vida; por ter-me criado e convivido em uma família composta por pessoas com tradição de dignidade, honestidade e justiça: meus progenitores, genitores e outros ancestrais; por ter-me dado uma vocação e permitido que a seguisse: a medicina me realiza e me dá excedentes além da sobrevivência

Agradeço a minha esposa Elizabete, aqui presente, único e exclusivo amor, pelo companheirismo decidido, leal e amoroso: parceira constante que me proporcionou tranquilidade, paz e filhos.

Agradeço meus filhos Fábio, hoje também médico, e Letícia: respostas muito gratificantes de meus esforços. Agradeço a oportunidade de se avô, meu neto, João Pedro: esperança de futuro. Todos eles me ensinaram a amar.

Agradeço às minhas pacientes, que muito auxiliaram na construção de minha vida: não só o patrimônio, mas especialmente o que eu sou. Elas me ensinaram como encontrar Deus.

Agradeço muitíssimo às confreiras e confrades que confiam em mim para os representar e me outorgam esta presidência da Academia de Medicina de Brasília.

Florence de Nightingale disse que o importante não é o que faz o destino, mas o que nós fazemos por ele.

E, Cora Coralina, poeta goiana, escreveu que o saber a gente aprende com os mestres e os livros. A sabedoria se aprende com a vida e os humildes. Recria tua vida sempre e sempre. Remove pedras e planta roseiras. Recomeça. Estamos todos matriculados na escola da vida onde o mestre é o tempo.

Para se ter mais futuro é preciso ser mais hoje 

Desejo a todos o respeito ao que é indispensável; além do trabalho a dignidade e além da dignidade a ação. E é na ação que está a realização e consolidação que toca a cada um de nós executar.

Muito obrigado.

Boa noite a todos.

Etelvino de Souza Trindade.