PROFISSIONAIS DA SAÚDE: resiliência e compaixão.

Desde o início da pandemia, e mais recentemente, podemos ver e ouvir manifestações de reconhecimento pelo trabalho dos profissionais da saúde, em várias partes do mundo. No Brasil isso ocorre também, ou principalmente, em relação ao SUS, que teve, tem e terá papel fundamental no atendimento dos pacientes acometidos pela pandemia e de inúmeros mais. 

Em geral, essas manifestações se referem aos profissionais de forma genérica ou especificamente aos fisioterapeutas, enfermeiros, médicos, etc. Talvez por isso, tenho frequentemente me lembrado dos 30 anos de trabalho como médico, exclusivamente em um único hospital do SUS, o HUB. A presente realidade juntamente com minhas memórias, muitas vezes afetivas, me trazem à tona, lembranças de profissionais e atitudes, na maioria das vezes esquecidos ou referidos nas manifestações. Assim, me recordo de alguns deles:

dos que transitam apressados entre os doentes;

dos que limpam o piso do pronto socorro, da enfermaria;

dos que trocam os lençóis sujos de fezes, urina e vômito;

dos que lavam feridas e drenam pus;

dos que olham escarro purulento e com sangue;

dos que pegam veias e passam sondas pelos orifícios;

dos que tocam reto e vagina com corrimento;

dos examinam bocas e dentes com hálito pútrido e pus na garganta;

dos que retiram feto morto retido;

dos que reduzem fratura óssea exposta;

dos que abrem e lavam abdome;

dos que recebem rosto desfigurado para repará-lo,

dos que amputam um membro para salvar a vida;

dos que quebram fecaloma (“pedra de fezes”);

dos que abaixam o olhar e tiram as luvas ensanguentadas;

dos sentem odores mais próximos de morte que de vida;

dos que, com suor na testa e olhos marejados, suspendem a reanimação;

dos que lavam e preparam os cadáveres;

dos que comunicam que faltou oxigênio no cérebro, que existe má formação, que o tumor é invasivo, que a vida foi interrompida;

dos que ouvem gritos, sussurros e lamentos de dor, angústia e desespero;

dos que se trancam no banheiro para chorar a impotência;

dos que titubeiam, não desistem e vão até o final do corredor olhar solitariamente o dia nascendo.

 

Acad. Dr Carlos Alberto de Assis Viegas