A HISTÓRIA DA MEDICINA DE BRASÍLIA CONTADA PELA ACADEMIA

                                                                                                               

dr ronaldoAcad. Ronaldo Mendes de Oliveira Castro (Cadeira 40)

Parte 1

Nasci no Rio de Janeiro, em 14 de setembro de 1932, filho de Jorge Mendes de Oliveira Castro e de Cecília Fernandes Figueira de Oliveira Castro. Desde a infância, sendo o primeiro filho homem, mais velho de sete irmãos, fui constantemente solicitado por meu pai, engenheiro do Serviço de Engenharia do Banco do Brasil e Prof. de Engenharia da PUC–RJ, a acompanhá-lo a diversas obras de construção. Hoje penso com um pouco mais de clareza, o quanto nós filhos somos conscientes ou inconscientemente, influenciados pelos desejos de nossos pais, e também por vezes, por pessoas do nosso convívio e admiração. Deste modo, acredito que o meu interesse pela engenharia decorreu da influência de meu pai. Cheguei mesmo, a realizar vestibular para Engenharia, na PUC-RJ.

Os tempos nos mudam e as influências também. Suspeito que passei a ser influenciado  por minha mãe, que com frequência referia-se a seu pai, com muito carinho e respeito. Ele foi um dos iniciadores da Pediatria no Brasil, Dr. Antônio Fernandes Figueira, e chegou a ter seu livro  Éléments de Sémiologie Infantile (1903), adotado pela Faculdade de Medicina de Paris. Foi também poeta e colega de Colônia de Estudantes dos grandes poetas brasileiros, Olavo dos Guimarães Bilac e Alberto de Oliveira. Durante o período em que servi o CPOR, nos anos 1951, convivi com colegas que estudavam Medicina, um deles meu primo irmão Gustavo. Lá conheci e tornei-me amigo do nosso saudoso Tito Figueroa.

Vários colegas me convidaram para fazer a prova de vestibular na Faculdade de Ciências Médicas, que era em São Cristóvão, pertinho do quartel. Foi então que entrei para a Faculdade de Medicina, onde fui colega do também saudoso Aloysio Campos da Paz, com quem frequentemente estudava e a quem, anos depois, ajudei a vir trabalhar em Brasília. A nossa turma de Medicina por sugestão minha, que era da Comissão de Formatura, escolheu o então Presidente da República Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira, médico, como paraninfo. O Presidente nos recebeu em fevereiro de 1960 no Palácio do Catete e nos presenteou com um convite para conhecer  Brasília.

Ainda estudante no 4º ano de Medicina, em 1957, casei-me com Maria Helena D’Arriaga Lima, filha do Dr. Bayard Lucas de Lima. Para tanto, trabalhei como técnico de laboratório do HSE (IPASE), para onde fui nomeado pelo Presidente Juscelino, através de seu colega e médico pessoal, Dr. Aloysio Salles da Fonseca. Com a renuncia do então Presidente Jânio Quadros, fui demitido do HSE, devido a um decreto seu no qual uma percentagem pequena de pessoas nomeadas pelo Presidente Juscelino teria que retornar às funções anteriores ou mesmo serem demitidas. Naquela ocasião já trabalhava na Unidade de Medicina Interna, serviço do Dr. Theobaldo Vianna, onde me especializei em Pneumologia com o Prof. Paulo Dias da Costa e posteriormente, com o Prof. Jayme Landman, em Nefrologia, que estava iniciando a técnica da diálise peritoneal. Nesse período conheci e trabalhei também com o Dr. Renault Ribeiro.

No 2º semestre do ano de 1961 fui pressionado a trabalhar em Brasília, no 1º Hospital Distrital. hoje Hospital de Base. Esclarecendo, minha esposa e eu havíamos vindo visitar seu pai, o Dr. Bayard, quando  surgiram o advogado da Fundação Hospitalar, Dr. Paulo César Carvalho de Mendonça e o Dr. Rizzi (Prefeito Interino), aparentemente para almoçar. Qual não foi meu espanto, quando o Dr. Paulo César me entregou um contrato para assinar e assim ingressar no 1ºHDB. Surpreso, disse-lhe que não estava preparado, não tinha roupa para trabalhar no Hospital e que ainda, trabalhava no SAMDU no Rio. Resumindo, disseram que eles conseguiriam a roupa e que além do mais, eu estaria de plantão no PS, onde o clínico era o chefe do plantão. O inesperado e a juventude (falta de experiência) causaram-me um enorme impacto e uma assustadora responsabilidade.

Naquela ocasião, não existiam ainda as unidades de especialidades, e tínhamos que atender toda e qualquer patologia. Aos poucos, fomos organizando e estruturando as diversas unidades de Medicina Interna. Renault e eu organizamos a Unidade de Nefrologia. Tive o privilégio de realizar a 1ª diálise peritoneal em um caso de uma paciente em coma hepático. Segundo constava na época, não havia ainda descrição e publicação de caso semelhante. A colocação do trocar no peritônio foi realizada pelo Dr. Francisco Pinheiro Rocha. Após cerca de 10 dias em coma hepático, com todos os exames sanguíneos alterados, a paciente saiu do coma e até hoje goza de saúde. Não posso deixar de registrar o pioneirismo da época e os improvisos, pois até a solução de diálise peritoneal era encomendada por mim ao Prof. Landman e vinha do Rio para Brasília em avião da antiga VASP. Posteriormente, com a chegada do Dr. Melânio Barbosa, que também havia trabalhado com o Prof. Dias da Costa em pneumologia, resolvemos organizar junto com o Dr. Abib Ani Cury, a Unidade de Pneumologia.

Deparei-me aqui com o início do excelente Plano de Médico-Hospitalar, estabelecido por Henrique Bandeira de Mello, baseado na ideia da criação de uma rede médico-hospitalar diversificada e descentralizada. Consistia em um modelo regionalizado de unidades satélites (Centros de Saúde), unidades hospitalares (Hospitais Distritais) para o atendimento preferencial de pacientes agudos e finalmente o Hospital de Base, cuja finalidade precípua era o atendimento de pacientes com enfermidades crônicas.

Foi o Dr. Bayard Lucas de Lima, primeiro Secretário de Saúde do DF que inaugurou o 1º Distrital de Brasília, em 18 de maio de 1960, na presença do Presidente da República, Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira e do Dr. Israel Pinheiro, Prefeito do Distrito Federal. Foi também o seu primeiro Diretor e o principal responsável por iniciara a implantação do Plano Médico-Hospitalar de Brasília. Para um médico, recém-formado e cheio de ideais,  esta era a oportunidade de realizar-me. No 1º HDB tive a satisfação em ocupar algumas funções de chefia, tais como a chefia da Unidade de Clínica Médica, a Vice Diretoria (interina) e alguns anos depois, a chefia da Unidade de Psiquiatria. Publiquei muitos trabalhos profissionais entre 1976 e 2016 e em 2014, “Acordes do Coração (Super Nova Gráfica, Brasília), um livro de poesias.